Antes que eu escreva todas as minhas
memórias daquela época, que ainda quero fazê-lo e não sei se vou ter tempo,
quero ir adiantando contar alguns episódios. Escolhi começar pela estória dos
Boca Braba, porque tenho sido provocado neste período de eleições municipais,
em que lideranças populares também se insurgem na disputa da política e dos
cargos de governo.
Os Boca Braba, escrito assim mesmo,
sem nenhuma preocupação gramatical, era um grupo formado em 1998,
insignificante para o tamanho de tudo no mundo, mas forte para exemplo do que
se possa e não se possa bem fazer na construção das relações políticas quando a
gente é jovem.
Eis que esse grupo, primeiro, tentava
organizar naquele pequeno município, uma espécie de agremiação juvenil
socialista, com militantes da Juventude do Partido dos Trabalhadores, junto com
outros da União da Juventude Socialista, do Partido Comunista do Brasil. Se
esses partidos não reconhecerem o que eu estou dizendo, agora, ressalvo que
aqueles indivíduos assim se auto-identificavam.
Mas como todo grupo de discussão
política não tem sentido sem efectiva participação na transformação da
sociedade, em 1999 decidiram, os Boca Braba, disputarem a direcção do grêmio de
estudantes da maior escola estadual daquela localidade, sem nem procurar saber
que a chapa de situação já não contava com a influência do adversário do ano
anterior, que dizia-se militante do Partido Socialista Brasileiro e que grupos
ligados ao próprio PT estavam apoiando essa chapa de situação. Parte dos Boca
Braba, sem assim se saberem, já haviam buscado derribar essa dita direcção de
grêmio, no ano anterior e, se tivesse durado mais dois dias a campanha
eleitoral, certamente teria conseguido. Em 1999, então estavam vencendo aquela
eleição.
O grêmio de estudantes funcionou
dentro do razoável da competência que é peculiar a esses grupos, porém com um
pouco mais de intensidade na discussão política. Dentro dessa discussão, uma
reforma estatutária e a formação de uma directoria colectiva, aboliam a
existência de hierarquia na entidade estudantil, eliminando a possibilidade de
exibição de pessoa pelo uso da sua qualificação directiva ali existente. Isso,
talvez, tenha incomodado um pouco o dirigente PCdoBista que, sendo voto
vencido, não pode evitar naquele ano. Respeitável a orientação ideológica do
partido sobre seus militantes de juventude; lamentável o preço que se vem
pagando até hoje por essas escolhas.
Lamentavelmente, o grupo ligado ao PC
do B e outros membros, ditos apartidários, resolveram, no ano seguinte, 2000,
formar chapa com o PSDB e ganharam a eleição, sob alegação de não estarem sendo
consultados para as tomadas de decisão. A verdade é que, de facto, o grupo
ligado ao PC do B estava sendo voto vencido em todas as decisões.
Surpreendentemente, mesmo tendo assinado a lista de convocação duma reunião, um
deles chegou a dizer que não era mais convidado para as
reuniões! Testemunhas viram isso, mas agora estão aliadas com os que
ficaram. Sem contar alguns episódios estranhos como sumiço de um cheque de
pequeno valor do caixa de um sindicato, mas que depois veio aparecer na
bilheteria do Baile dos Boca Braba, dando troco da entrada para a cerveja...
Sem contar do baile do próprio grêmio estudantil que deu prejuízo, que nunca
foi prestado contas; do carro que fazia 800 metros por litro de gasolina.
Não bastasse tudo isso, chegou-se a
dizer que era ruim ser director dum grêmio estudantil alguém que era
pré-candidato à eleição municipal seguinte! Ora, como se uma coisa fosse óbice
à outra! Quando na verdade as melhores lideranças políticas no mundo inteiro,
são aquelas que sempre tiveram envolvimento com a comunidade e a luta social. O
mais ruim desta alegação foi que 4 anos depois o próprio sujeito que fez essas
alegações apresentou-se como candidato.
Depois seguiram-se coisas
inexplicáveis, como o facto de que o líder PCdoBista da cisão, além de tomar o
grêmio de estudantes, foi parar na direcção do sindicato em que o líder
identificado com o PT esteve. Ademais, o irmão do PCdoBista vinha sendo o maior
incentivador do PTista para fazer-se chapa de oposição, também, no sindicato,
vagando, também esse posto, para o PCdoBista.
De maneira nenhuma quer-se, aqui,
atribuir qualquer qualificação "piorativa" contra qualquer desses
partidos. Mas medir o quanto o interesse particular, o ciúme e a impaciência
podem desconstituir um grupo que era capaz de abrir caminhos bem melhores para
a discussão política e o crescimento do pensamento crítico numa pequena cidade
do interior.
Agora que os tempos passaram, alguns
do grupo ainda tentam uma reaproximação. Mas torna-se difícil consertar o que
foi quebrado... tem muita coisa que ficou mal explicada... a vaidade quebrou os
queixos àquela época! Os Boca Braba se morderam tanto entre si, de tão
queixo-duro, se mataram uns aos outros!
De festinha se pensa em voltar a reunir, mas não foi na festa que as coisas se quebraram! Esse rejunte, talvez, deva ser feito exactamente onde tudo se quebrou: - na política!
Agora todos pagam o preço conforme suas cotas e suas possibilidades. Não
há mais, assim, como combater o poder económico e as candidaturas ligadas aos
movimentos populares padecem, enquanto os que sempre pertenceram às famílias
mais tradicionais na cidade, seguem mandando em tudo (...).
Os grupos que restaram, tanto de um lado quanto do outro, da cisão dos Boca Braba, actualmente restam tão pequenos e inominados que não conseguem negociar coisa nenhuma dentro das composições políticas dos seus respectivos partidos.
Os grupos que restaram, tanto de um lado quanto do outro, da cisão dos Boca Braba, actualmente restam tão pequenos e inominados que não conseguem negociar coisa nenhuma dentro das composições políticas dos seus respectivos partidos.
Que lugar podia dar o PSDB para um grupo que, quando conseguia crescer um bocadinho, partia-se, sempre!? Que lugar vai dar, na administração municipal, o PT, para quem nunca conseguiu agregar, organizar e fazer-se entender num período que não é de atentados nem de guerrilhas?
Não quero ser fatalista, mas acabei de lembrar duma frase do cantor
nativista gaúcho, Gildo de Freitas que diz: "bãmu pará gaitêiru; nãun
adiãnta! Nãun vórta máis!