Eram quatro e
meia da madrugada. Tudo sozinho... e uma nevoazinha um pouco mais acima do
campo. Saí da estrada. Entrei de carro no campo por debaixo da névoa. Desci do
carro e caminhei até o barranco. Vi que tinha um pedaço de chão remexido.
Chegou uma viatura de polícia e um único policial, que desceu do carro e parou
ao meu lado, olhando aquele chão remexido. Dalí a pouco já começava clarear o
dia. Foram chegando outras pessoas que foram rodeando aquele chão mexido, em
meia lua, contra o barranco. O campo continuava lindo, mas sobre o terreno
remexido, diversos pedacinhos de coisas que eu uso no meu dia-a-dia. Alguém
começou a cavar. O cadáver estava amarelo, muito amarelo. Faltava um dente, a
boca estava aberta e a cara era troço muito bagunçado, sob cabelos louros,
cacheados em cachos grandes. Umas mulheres olhavam à exumação com a mão no
queixo e choravam, sentidamente.
O policial me
mandou embora, dizendo que eu não tinha nada a ver com aquilo. Entendeu que foi
uma coincidência eu querer caminhar naquele campo, de madrugada, enquanto ele
procurava um cadáver. Mas eu não entendia por que as minhas coisas estavam sobre
aquela sepultura, nem por que eu havia sentido vontade de estar ali.
Uns quinze
anos antes, eu recebi amigos para um jantar, mas os cadáveres do quintal
começavam a ser descobertos pelo vento. Era terra arenosa, preta, muito
fininha. Chamei um amigo para me ajudar a raspar todos aqueles ossos e colocar
fora. Naquela outra vez eu sabia que os cadáveres eram meus, só não lembrava mais de
quem foram antes. Eu e meu amigo sacáramos aquilo
tudo dali e jogamos no mato, pela estrada. Eu deixara as pessoas jantando lá em
casa. Nem lembro mais se quando eu retornara ainda estavam lá. Sei que nesse novo evento, eu não entendia mais nada...
2015 – 07 – 12